sexta-feira, 6 de novembro de 2015

PANORAMA FIDA 2015: a alma do FIDA nos cliques de Aline

Aline Nascimento
Foto: Valério Silveira

Ao encerrar esta série de postagens sobre o FIDA 2015, registro aqui o meu agradecimento e o orgulho por ter realizado esta parceria com Aline Nascimento, que deu alma às postagens com suas fotos magistrais. Sem ela e seu talento, este blog certamente passaria batido. 

Aqui deixamos nossas impressões sobre o que o palco do FIDA nos revelou este ano. Eu com as palavras, Aline com as imagens. Contamos histórias, falamos de sensações, da infinita poesia que habita a dança. E adoramos fazê-lo.

Quero agradecer também a Afranio Brito, pela cessão da foto de Karen Mesquita e Cícero Gomes, e à grande colega Norman Delgado, jornalista, pelas fotos da mesa-redonda na Oi. Mais um FIDA se encerra, mas seus efeitos ainda nos inspiram. 

Obrigada a todos e até o Especial FIDA 2016, se Deus quiser!

De mãe para filha: as gerações do ballet, no FIDA e na vida

Aniela (E), filha de Paula Kalif, e Thaissa (D), filha de Tereza de Macêdo:
 dinastia de bailarinas na Cia. de Danças Clara Pinto
Foto: Aline Nascimento


Raiana, filha de Rosana, já se formou, se casou e, no momento, não dança. Josiane, filha de Jacira, também se casou e pensa em voltar a dançar. Isadora, filha de Terezinha, já dançou muito; agora é tradutora e mudou-se para o Rio de Janeiro, mas não perde um só FIDA. Ana Clara, filha de Clara, deixou a dança mas comanda uma das unidades da escola. Aniela, filha de Paula, dança sempre que pode, mas divide o palco com a arquitetura. Thaissa, filha de Tereza, de casamento marcado, permanece ativa na Companhia de Danças Clara Pinto.

Rosana, Terezinha, Paula e Tereza começaram pequenas no ballet; cresceram, floresceram, tornaram-se bailarinas e depois professoras. Assim como Silvia, também. Todas viram o FIDA nascer e nele dançaram por vários anos. Hoje integram uma das mais afinadas equipes de produção que já se viu. Mas o exemplo para as filhas ficou; assim como suas mães, as meninas começaram cedo na Escola Clara Pinto, cresceram, floresceram, tornaram-se bailarinas. Estudaram, escolheram carreiras, casaram, mudaram, mas todas permanecem, de alguma forma, ligadas à dança.

Eloysa também começou pequena, cresceu e entrou para a companhia de danças. Há algum tempo deixou os palcos para assumir os bastidores do FIDA e dar aulas de ballet. O filho Eloy, de dois anos, ainda não decidiu se vai ou não se incorporar à atmosfera, mas presta muita atenção a tudo que acontece no palco. Lorena foi uma refinada solista da companhia. Hoje, advogada e casada, é mãe de João e espera o segundo filho. Amélia, bailarina carismática, casou e foi morar no exterior, mas também marca presença todos os anos ao lado de Tereza, na coordenação de palco.

Thais e Manuela estão na companhia, enquanto Aline, fisioterapeuta e fotógrafa,  não tem mais tempo para dançar, mas pensa em voltar a dar aulas de sapateado.

Na Escola de Danças e na companhia também, os ciclos de talento e criatividade continuam a se repetir. Famílias se formam em torno da arte de dançar. Filhas e filhos crescem com a música certa nos ouvidos e os compassos bem marcados na alma. Só a magia que a dança produz consegue explicar por que todas essas mulheres continuam ali, unidas e determinadas, empenhadíssimas em fazer um belo festival, seja no palco ou nos bastidores.

Do frenesi da preparação aos abraços atrás das cortinas, quando o festival termina, sente-se o brilho nos olhos, a concentração, o entusiasmo em todas essas mulheres, as que dançam e as que fazem a dança acontecer. Sinais de uma força tremenda que as prende na fina malha da arte, e que as faz produzir maravilhas o ano todo, todos os anos, por várias gerações.





PANORAMA FIDA 2015: A mais criativa das codas encerra o festival



Encerramento apoteótico: Karen Mesquita, Erick Gutierrez, Cícero Gomes, Luana Brunetti e Federico Fernández
Foto: Aline Nascimento

Pode-se dizer, parafraseando Peninha na música Sonhos, que "tudo era apenas uma brincadeira que foi crescendo, crescendo...", para contar por que o FIDA é o único festival de dança do Brasil que é encerrado com uma coda de Don Quixote coreografada na hora, a cada ano.

A brincadeira partiu dos bailarinos Cícero Gomes, André Valadão e Federico Fernández, já nem me lembro mais em que ano. Em segredo quase absoluto, todos os bailarinos clássicos que se apresentaram no FIDA se reuniram para criar uma coda extra, inesperada, e surpreender a plateia. O publico, de fato, delirou com aquela conspiração criativa! Pronto, virou tradição. Desde então,  todo mundo fica esperando para ver qual vai ser a nova surpresa.

Cícero Gomes, como sempre, é o cabeça dessa criação colaborativa, que se sofistica a cada ano. Desta vez, o bailarino empolgou como um verdadeiro mestre de cerimônias: sentou na beira do palco, conversou com a plateia, criou clima, incentivou a participação do público. Até se livrou de parte do figurino e se colocou em trajes, digamos, mais confortáveis para a efeméride.

Estreante no FIDA, Erick Gutierrez aderiu instantaneamente à ideia e entrou com o ingrediente que faltava: o sapateado. A grande novidade é que Karen Mesquita resolveu fazer dupla com ele e entrou em cena envergando sapatos com chapinha e um tubinho preto de arrasar! 

Claro que Federico Fernández e Luana Brunetti, outra estreante com louvor, não poderiam ficar de fora: ao exuberante "tac-tac" do sapateado de Erick e Karen, ora em solos, ora em dupla, Cícero, Federico e Luana acrescentaram giros formidáveis, fouetés, manèges e toda sorte de belos movimentos, em combinações inusitadas, que viraram do avesso a música de Ludwig Minkus. 

Acredito que Marius Petipa não se reviraria no túmulo, mas aplaudiria a brincadeira esfuziante, porém fundamentada, que esses adoráveis criativos inventaram para colorir o último dia do FIDA.

Erick Gutierrez e Karen Mesquita: Don Quixote na sola dos pés
Foto: Aline Nascimento

Como todos os anos, o Teatro vem abaixo e a plateia vibra muito, grita muito, curte muito essa descontraída demonstração de carinho que os grandes bailarinos que brilham no FIDA oferecem, na despedida. 

Estas fotos dizem tudo. Agora é esperar pelo ano que vem!

Erick Gutierrez, Cícero Gomes e Karen Mesquita; criatividade e alegria
na coda de encerramento
Foto: Aline nascimento

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

PANORAMA FIDA 2015: "Belém 400 anos" homenageia o carimbó e seu rei, Pinduca

"Belém 400 Anos", com a Cia. de Danças Clara Pinto
Foto: Aline Nascimento

Sou apaixonada pelo projeto Resgate da Cultura Paraense. Sem dúvida uma ideia fantástica: registrar, em movimento, a memória dos grandes artistas do Estado do Pará. E as coreografias estreiam sempre na abertura do FIDA. 

A ideia de criar o projeto foi fruto da colaboração entre três pessoas: o coreógrafo Fábio de Mello, em seu ano de estreia na direção artística do FIDA; Clara Pinto, diretora e criadora do festival; e Gilberto Chaves, diretor do Theatro da Paz. Por coincidência e sorte minha, isso aconteceu em 2003, na primeira vez que participei do FIDA, convidada por Fábio. 

Gilberto Chaves, um grande aficionado da ópera, foi quem sugeriu que os primeiros homenageados fossem dois emblemáticos talentos paraenses: a soprano Maria Helena Coelho Cardoso, contemporânea de Bidu Sayão, e o pianista e compositor Oriano de Almeida. A trilha foi extraída de um disco magnífico, gravado pelos dois e editado pela Secretaria de Cultura do Estado do Pará. Fábio de Mello se empolgou e investiu todo seu talento e criatividade em uma coreografia irretocável, que emocionou fortemente a plateia do FIDA.

Este ano, o projeto homenageou Pinduca, o rei do carimbó. Uma grande festa de cores e de alegria tomou conta do palco do Teatro da Paz. A coreografia de Marcelo Pereira, talentoso criador brasileiro radicado na Suíça, introduziu nuances contemporâneas à malemolência do carimbó original, musicalmente modernizado por Pinduca. 

Em clima de um verdadeiro show, o carimbó entrou em cena triunfante como nunca, entremeado também com a suavidade do lundu, ingrediente que tornou o espetáculo ainda mais atraente. Saias coloridas e sensuais para as meninas com flores no cabelo, roupas brancas de aniagem para os homens. Toda a sedução do carimbó foi representada, mas também o seu lado alegre, de folguedo, de brincadeira gostosa, popular.

Em seu agradecimento, Pinduca observou que, naquele palco, estava acontecendo a vitória do carimbó, depois de anos de proibição e das torrentes de vaias que recebeu pela vida, fatos que nos contou sem tristeza. Muito ao contrário: era a alegria em pessoa ao final da apresentação, reinando no palco ao lado dos bailarinos e de Clara Pinto.

Belém 400 Anos é homenagem feita de dança e alegria, de cuidado e harmonia. Um belo espetáculo que disse a que veio e fez todas as honras possíveis ao Pinduca, rei de fato e de direito.

Pinduca em momento de glória, ao lado dos bailarinos 
e de Clara Pinto, no palco do Teatro da Paz
Foto: Aline Nascimento

































quarta-feira, 4 de novembro de 2015

PANORAMA FIDA 2015: Direto de Fortaleza, o duo "Lado a lado"

Naiane Freitas e Felipe Sousa em "Lado a lado"
Foto: Aline Nascimento


É esta a imagem que se revela no palco do Teatro da Paz, tão logo a luz se acende: duas pessoas atadas. Ou estariam presas numa teia? Pronto, nossa atenção já foi capturada - e ligamos nossas antenas para saber o que vai acontecer daí por diante.

O duo Lado a lado, interpretado por Naiane Freitas e Felipe Sousa, da BCAD Companhia de Dança de Fortaleza, revela um engenhoso jogo de sedução e poder, um campo de disputa habilmente construído pela coreógrafa Atenita Kaira com movimentos aparentemente secos, mas que revelam muita coisa além das aparências.

O deslindar-se dos fios é uma dança de silêncios, quase como um movimento no tabuleiro de xadrez: olhos nos olhos, concentração total, cada um sabendo que o próximo gesto pode abrandar ou complicar tudo. A sensação é que há um subtexto de tensão e embate, mas nada é explícito e sim sugerido. Acompanhamos os movimentos do casal sem elementos para antecipar nada; e o que se desenrola é uma sucessão de jogadas em que movimento, drama, música e técnica nos envolvem num clima de dúvidas, perplexidade e poesia. 

Os bailarinos são perfeitos na condução desse mergulho em profundidade. Logo que começam a se soltar das peias, instala-se uma certa ansiedade: como será o desenlace? Logo a seguir, a surpreendente leveza e fluidez dos movimentos, tanto dos dois quanto do fio em si, revela o domínio absoluto que os bailarinos têm da coreografia e também do drama, ministrado na dose certa para nos instigar e nos atrair ao mesmo tempo. E não perdemos nada, pois é impossível tirar os olhos deles ou do fio. Tudo corre junto no mesmo ritmo, entre vibração e silêncio, quase como a respiração da gente.

Eis que o fio, ao mesmo tempo que foge, enleia - e lá vão os dois na mesma valsa que os separa e que os une. Assim como na vida e na maioria dos relacionamentos, em que o encontro e as diferenças se alternam. Ou convergem para algum lugar ou encontram destinos opostos.

Em Lado a lado, o fio acaba por vencer e novamente envolve o casal, tal como no início. Ainda assim, não sabemos se há de fato um vencedor ou dois vencidos: os olhares permanecem em riste, os corpos rígidos, e o momento seguinte fica para nossa imaginação. 

A simples sugestão, lançada no ar com o final da música, é a alma de Lado a lado, uma obra feita de sutilezas e de competência, tanto da coreografia quanto do desempenho dos bailarinos e da direção precisa, assinada por Janne Ruth.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

PANORAMA FIDA 2015: Mariana Carossa e Kauan Soares

Mariana Carossa e Kauan Soares no pas-de-deux de O Quebra-Nozes
Foto: Aline Nascimento

Mariana Carossa e Kauan Soares são solistas da Companhia Brasileira de Danças Clássicas, de São Paulo. Bailarinos afinados e carismáticos, estrearam no FIDA com obras de repertório, remontadas por Guivalde de Almeida, professor e ensaiador de autoridade e talento reconhecidos nacionalmente. 

Os dois são pessoas encantadoras, descontraídas, que encarnam bem o espírito dos artistas da sua geração. Profissionais concentradíssimos, são rigorosos em sua preparação; nenhum detalhe fica esquecido, das aulas ao aquecimento, dos ensaios ao figurino. Na bagagem, os grand pas-de-deux de O Quebra-Nozes e Diana e Acteon.

Como O Quebra-Nozes veio primeiro, trouxe consigo a primeira impressão, feita de paixão, técnica e apuro. Mariana Carossa tem aquela qualidade etérea que só algumas bailarinas possuem - e que faz com que deslizem, em nossa imaginação, em tons de sépia e lentes algo desfocadas. E que, de certa forma, nos ludibriam: há momentos em que ficamos sem saber se são de fato reais ou visões de algum paraíso da dança.  

Foi assim a sua Rainha das Neves: não deixou espaço para que nos ativéssemos apenas ao rigor técnico. Não, na verdade a aura de encantamento com que nos envolveu a aproxima de mitos nunca vistos, pelo menos por mim. Quem sabe uma Pavlova distante, em algum outro século nem tão distante assim? Sorte que a música, a cena, o teatro, tudo é real - e, em algum momento, a gente volta e percebe que ela existe mesmo. A presença forte e a técnica impecável de Kauan Soares nos ajudam a fazer este ancoramento com a realidade. E a química entre os dois faz com que os personagens ganhem cada vez mais consistência e veracidade.

Interessante vê-los em uma obra tão distinta quanto Diana e Acteon, que requer atributos mais aguerridos, digamos, dada a força dramática exigida dos bailarinos. Mesmo num universo totalmente diferente do anterior, percebe-se que a química é a mesma, porém acrescida de novas nuances - de maior entrega e capacidade, técnica e dramática, para assumir e correr riscos maiores. O resultado é uma atuação memorável, que só nos faz ter vontade de aplaudi-los cada vez mais, orgulhosos e felizes diante de tanto talento.

PANORAMA FIDA 2015: Oficina de ballet clássico com Toshie Kobayashi

Oficina de Toshie Kobayashi - Ballet clássico
Foto: Aline Nascimento

Tenho uma gratidão manifesta pela Profa. Toshie Kobayashi desde o meu primeiro FIDA, em 2003. Quando, no domingo final, vi o palco do Teatro da Paz ser tomado por centenas de meninas lindas, de várias idades, todas iguaizinhas, vestidas de preto com tutu romântico impecável, coques arrumadíssimos, sapatilhas muito bem atadas, como manda o figurino, fui invadida por lágrimas. Aquela simples visão fazia valer a pena todas as lutas da gente para manter viva a chama do ballet. 

Naquela época eu e meu grande parceiro Antonio Bento, bailarino e coreógrafo, lutávamos arduamente para segurar uma frágil e delicada companhia de dança em minha cidade natal, Barra Mansa. A visão das meninas foi uma grande emoção que guardei comigo e confessei à Profa. Toshie, que com os anos vim a conhecer melhor no FIDA. 

Com sua simpatia e rigor típicos da herança cultural japonesa, aliados a uma disposição inesgotável para transmitir sua arte, Toshie Kobayashi é queridíssima pelas bailarinas ou aspirantes a bailarinas de Belém. Estou certa de que isso acontece onde quer que ela vá. Esse encantamento explica facilmente as 120 alunas que se inscreveram este ano para participar de sua oficina no FIDA. - Cento e vinte! - nos contava ela, animada, logo no segundo dia. 

No domingo, fez-se novamente a mágica: sílfides e mais sílfides tomaram o palco do Teatro da Paz, numa organização irretocável e absolutamente idênticas, para executar a coreografia elegante e básica de um grand défilé de encher a alma. 

Um resultado final que reflete ensinamentos inestimáveis sobre a beleza e a perfeição que tornam sublime a arte do ballet, e que todas essas meninas, tornem-se ou não bailarinas, levarão consigo para a vida inteira. 

Por isso, a emoção de ver no palco as meninas da Profa. Toshie se renova sempre.